Difícil... Muito difícil falar
sobre isso. Nesse momento estou ouvindo “Black Sabbath 1970” e muita coisa se
passa em minha cabeça. Os sinos, o vento, a chuva. Ozzy cantando como se fosse
marido da Dona Morte (aquela do Penadinho, lembra?), todo mundo um tanto calmo,
mas absurdamente sinistro; Tony Iommi fazendo da guitarra algo muito além do
que simplesmente tocar. Tente expressar com palavras – arrisco-me a dizer que o
peso que tanto caracterizou uma era vinha praticamente do falante do seu
amplificador. É claro que, como banda, todos tinham seu peso, sua evidência.
Mas o timbre de Tony...
Em 1970 o mundo era um tanto do
sonho que vivemos hoje (claro, depende de tua idade e do que você considera ser
um sonho). O rock, em seu caule, era ousado e pesado. Mas não barulhento e
agressivo. Alguns chamam isso de hard rock. Eu chamo de evolução. Não consigo
imaginar Ozzy e Tony pensando “precisamos fazer algo de diferente, algo que o
mundo ainda não ouviu”. Imagino que a coisa simplesmente aconteceu.
Ingredientes num caldeirão fervendo. Asa de morcego, unha de porco, terra de
cemitério. Contos do túmulo. Junta a galera em volta da fogueira e vamos
enxergar a diversão no crepúsculo.
Há de se entender que algumas
pessoas simplesmente não dão a mínima para demônios, diabos, anjos, céu e
inferno. Algumas pessoas até fazem disso o seu ganha pão. Falam disso como se
fosse a coisa mais natural do mundo. Se você parar pra pensar, realmente,
coisas que assustavam o povo antigo pode não fazer muito sentido hoje em dia.
Vivemos num mundo onde o terror é outro, é bomba, é corrupção, é assalto, é
assassinato, causados pelo próprio ser humano, e que algumas pessoas justificam
tudo isso dando créditos ao tinhoso. De qualquer modo, até os assassinos amam.
“My name is Lucifer, please take my hand”. O que isso tudo pode querer dizer
são outros mils (pra não dizer quinhentos), o importante é que assustou e ainda
assusta uma multidão de gente que, só de pensar em Ozzy e companhia, treme dos
pés à cabeça.
Quanto à música que há nesse
disco, ela é brilhante, é luz. Um diamante que reflete a claridade de um mundo
recheado de mistérios, de uma vida dosada de bem e mal. Ozzy canta muito,
preciso em suas notas. Tony é direto, o tipo de guitarrista que deu as mãos a
tantos outros e influenciou toda uma geração de guitarristas que vieram depois.
Geezer Butler e Bill Ward completam o álbum de figurinhas.
Em muitas de minhas viagens sem
sair do lugar, estive com Guilherme Moraes enquanto ouvíamos Black Sabbath nos
monitores do estúdio e ele berrava e apontava para os falantes, como se ali
estivesse acontecendo uma performance ao vivo: “o que me entristece é o pré
conceito musical que há em alguns caras, pois o que há de errado em apreciar
isso e ao mesmo tempo um, sei lá... Vinícius de Moraes?”. Não vejo nada de
errado nisso. Não é ser eclético, é ser justo.
A nova música pulsa. A nova era.
Pulsa de dentro pra fora, de fora pra dentro. A música nunca estagnará. Ela
sempre terá suas ramificações, seus caminhos, suas encruzilhadas. A música dá
cor à vida. Mesmo se ela for escura, onde não há como enxergar as cores. Mesmo
que seja um sábado escuro, enegrecido, há luz nisso tudo. Muitas vezes é na
escuridão que enxergamos além, pois deixamos de usar os olhos e passamos a usar
os ouvidos, nosso grande órgão, nosso mestre, nosso guia. O velho é aquele que
morre. A história é eterna. É nova, pois o tempo é só uma questão de ponto de
vista.
Black Sabbath é um retrato
perfeito da virada, do novo, do incomparável, do ditador de tendências. É o
simbolismo do roqueiro que se veste de preto, com camisas de banda, com
correntes, anéis. É uma banda que faz
parte da evolução e que contribuiu para essa evolução continuar na maré de
tendências. O mundo agradece.
Dedico esse texto ao querido
Danilo Bracalenti, o cara que me disse “Pompeo, você já ouviu isso?”, apertando
o play em seguida.