terça-feira, 14 de julho de 2015

Jalapão - Tocantis, Brasil.



                                                       O planeta Terra, Jalapão. 


O Jalapão é logo ali. 

Esse post é carinhosamente direcionado aos que, como eu e minha mulher, desejaram (desejam) fazer essa viajem e não encontram muitas informações sobre esse lugar único no planeta Terra. Aliás, a Terra é um planeta perfeito. Estar no Jalapão é confirmar a prática dessa teoria. Inúmeras vezes eu pensei "mas poque olhamos tanto para fora do nosso sistema?". Nosso planeta - nosso Brasil - é de uma peculiaridade infinita. O Jalapão, por mais finito que seja, nos dá a sensação de que o universo é, de fato, sem fim.

Começamos nossa viagem planejando muito (não tão bem, essa é a graça) o que faríamos. Onde dormiríamos? Com quem iríamos? Como faríamos? Optamos, logo de cara, em ignorar por completo os falsos avisos dos pseudos guias que há nas poucas agências (sic) de viagem. Tudo nas mãos desses caras é caro. Me lembro de ligar para hotéis em Palmas para ter informações mais concretas e nada era dito sem antes depositar alguma grana para reservas e mais reservas. Via-se no site do Korubo que aquilo é para gente rica. Começamos a pensar que o Jalapão era para ricos (como tudo que há de belo nesse planeta, o povo gourmet tem mania de achar que é privilégio deles) Esqueçam! Korubo fica num lugar limitado e te limitam a explorar, errar, suar, atolar, rir e conhecer o maravilhoso povo local. Nada contra essa galera, mas não venham dizer que só por essa agência é possível conhecer o grande Jalapo, porque isso é mentira! 

Ou então os campings com seus guias e suas 4x4, com tudo a vontade, comida, bebida, etc... Tudo caríssimo! Pra quem tem $ e não quer suar a camisa, ok... Fique à vontade. Pra quem, como nós, gosta de fazer as coisas no seu tempo, no seu roteiro, perguntando, errando e acertando, continue lendo!

Nossa atenção foi despertada pelos fóruns sobre o Jalapão e uma coisa é certa: vá de 4x4. Os moradores locais conseguem andar com o carro que for, mas você não mora lá. É primordial um veículo forte, confortável, com ar-condicionado (no meio do nada a 36°, em pleno meio dia). E ir sozinho (sem guias) é uma experiência ímpar. Primeiro: guias são chatos e muitos deles arrogantes. Os verdadeiros guias não te cobram nada para te dizer a direção certa e a quilometragem para essa ou outra cachoeira. Os moradores de Mateiros são gente simples e sorridentes, sentem felicidade em receber você. 

Estudamos a melhor forma de ir e fizemos o seguinte: saímos de Campinas num voo para Palmas com escala em Brasília. Em Palmas, ainda no aeroporto alugamos uma S10 4x4 da empresa Unidas (justos e corretos). Façam as contas e verão que sai mais barato do que os absurdos R$500 a diária que te pedem para dar os rolês. De Palmas fomos até Ponte Alta do Tocantis, passando por Taquaralto e Taquaruçu. Não se hospede definitivamente em Ponte Alta. As coisas realmente fantásticas estão em Mateiros. O Jalapão é uma região que agrupa vários municípios, é confuso daqui, mas lá você entende perfeitamente. E em três dias você entende que todo município puxa a sardinha pro seu lado dizendo "o Jalapão é aqui"... Mas confie, é em Mateiros que rola a coisa toda. 

Você vai perceber que quilometragem é algo meio chutado pelas placas e que 150 quilômetros na cidade é uma coisa, no Jalapo é outra história. Não interessa a hora que você vai sair: leve água (muita, uns 2 litros para cada tripulante) almoce antes de pegar a estrada para Mateiros. Almoçamos em Ponte Alta no restaurante que fica na beira do rio que passa em baixo da tal ponte. Somos veganos e nos saímos muito bem. Se você come carne, cara, você vai sair de lá rolando. A culinária Jalapoeira consiste basicamente em salada de repolho temperada com coentro (maravilhoso), frango caipira (qualquer lugar que você parar você vai ver capirinhas pretos ciscando), arroz, feijão, mandioca (frita ou cozida) e macarrão alho e óleo. Você tem que reservar porque eles não se organizam como o sistema paulista diz, eles fazem do jeito deles e é você que tem que se adaptar. Claro, eles cozinham além do que precisam então sempre tem janta sobrando, duvido que você vai dormir com fome se chegar sem avisar. Em Ponte Alta, por exemplo, cheguei assim "Oi, tem almoço?". 

Ainda em Ponte Alta abasteci a camionete e pedi informações. O posto que fica de frente para o começo da estrada tem um cara muito legal. O nome dele é Cléber e nos ensinou quase tudo que precisávamos. Viu nosso carro e disse "Vai enfrentar o Jalapão?". Eu não acreditava ainda nessa coisa de enfrentar, mas só depois que você entra na estrada você entende.  "Vai na maciota, deixa traçado daqui até lá. Passe na cachoeira da Velha, que fica a 90km de Mateiros e se banhe na praia que forma logo em seguida dela. Você vai chegar à noite em Mateiros". Ele tinha um mapa pendurado e tiramos uma foto. Foi isso que usamos como bússola na viagem toda. Disseram que celular não pegava - é verdade. Disseram que GPS não pega - não sei, não levei, mas alguns GPS trabalham no modo off-line. Disseram que não tinha placa. MENTIRA! Pra tudo tem placa. É o ganha pão deles, é o turismo. A coisa funciona. 

                                                       nossa bússola


A GRANDE E SINUOSA ESTRADA DE TERRA DO JALAPÃO! 

Fomos e por algumas horas a estrada de areia (sim, areia. Algumas vezes parece terra por estar agrupada e de cor escura, mas o cerrado é feito de areia) nos parece tranquila, vou a 70km/h. Logo percebo que não estou nas estradinhas de chão que pego perto de casa. O solo começa a ficar ruim mesmo e nas costelas (ondulações que fazem teu 4x4 tremer feito vara verde) perdemos uma lanterna traseira, que caiu despercebidamente e foi engolida pelo pó que fica pra trás. Imediatamente você é cercado por um mar de vegetação do cerrado de um lado e do outro e tudo que tem à sua frente são quilômetros e quilômetros de estrada de terra (de novo, é areia!). Você já começa a pensar que se teu carro quebrar você tá ferrado. Isso tem sua verdade, pois a densidade de ser humano nesse lugar é muito pequena. Dê um google e você vai entender. Mas sempre tem gente passando. E há uma coisa no Jalapão que pra quem é de São Paulo ou de cidades grandes costuma sofrer para aceitar: lá as pessoas se ajudam. Com alguma hora de estrada somos surpreendidos por duas pessoas numa moto. Eles percebem que estamos inseguros (estávamos parado lendo uma placa de uma propriedade privada) e param. Já pensei "ferrou". Ele vem ao meu lado e eu digo, sem jeito "Mateiros, é pra lá? Tá certo?". O cara diz "Isso mesmo, tantos quilômetros nessa direção". Sorri e vai embora. Lá todo local anda de moto. Não atola e é barato para eles. Então você vai ver de senhorinhas a garotões com sua pele marcada de sol encobrando a estrada hostil do Jalapo. Não tem como se perder, é só ficar na estrada principal, que é inconfundível. 

Depois de passar por uma subida avassaladora, na qual no topo tem um pequeno pedaço de asfalto (seria impossível passar sem isso) chegamos à entrada da Cachoeira da Velha - mais 29 km fora da estrada principal. Vale a pena! Faz parte tudo ser longe e o prêmio é sempre compensador. Você passa por uma grande casa (que me disseram ter sido construída por Pablo Escobar, o Jalapão já foi rota de drogas, mas eu paro por aqui sobre essas curiosidades porque a graça é descobrir perguntando aos amigos de Mateiros que vão surgindo) e no meio da estrada há um cara parado segurando um celular. Descobrimos se passar por uma espécie de fiscal. Conta quantos entram para ninguém acampar lá dentro. É proibido. Ele nos saúda e diz que podemos ficar até 17h30 e que nos espera na volta. Descemos (no Jalapão não existe esquerda, reto ou direita mas sim desce ou sobe) até a cachoeira e ela é de dar medo. Um barulho forte, muita água e aquilo é para se ver. Fotos, filmagens, maravilhoso. Daí você desce até a prainha que esse rio forma. Aqui começa o Jalapão, no sentido da surpresa. Entre tanto pó e secura há uma praia! Coisa mais linda do mundo. Banhamos e continuamos viagem. Faltavam 90km para Mateiros. 


                                                       tem placa sim! 


                                                       cachoeira da velha


                                                       oi! esse sou eu, na praia do serrado. 




Seguimos viagem e, cara, cansamos! Ainda bem que almoçamos antes. Era de noite quando passamos pelas dunas e resolvemos que iríamos voltar outra hora. Na escuridão a gente percebeu que as grandes montanhas que formam as chamadas chapadas estavam sendo iluminadas por alguma coisa atras delas. Mas o quê? Antes mesmo de perguntar lá estava ela, a Lua cheia. Esqueçam fotos. Vimos uma lua que só no Jalapão, de noite, foi possível. Fomos abençoados.  Chegamos em Mateiros mortos de cansaço, com fome e ansiosos por saber onde iríamos dormir. Não reservamos nada, pois na internet só há informação da galera que tem pousada, uma média de R$150 por noite com café da manhã. Paramos no posto da cidade (há dois, gasolina a R$4,90 o litro e diesel a R$3,80, caro porque a estrada pra chegar lá, convenhamos, encarece tudo, menos o coração do verdadeiro cidadão de Mateiros) e perguntamos onde há um camping por ali. Ah é! Levamos barracas, por dois motivos: baratear nossa viagem e tirar de vez da minha cabeça que acampar é coisa pra maluco. Confesso que dormir dentro de uma barraca foi um pouco desconfortável. Eu meço 1,80 e sou gordo. Já viu né... Mas nos fins dos dias eu estava tão morto que só de encostar eu adormecia. Voltando... Um cara no posto nos disse de um Camping que estava a 3 km de nós. Não sabíamos sequer a direção e o cara ofereceu para nos levar, seguindo o carro dele, até a primeira placa de identificação do lugar (aí a hospitalidade deles de novo) e fomos ao Beira da Mata. Fui recebido pela cadela mais linda do Jalapão, a Cacau. Depois veio o dono dela, um garoto bonito de aperto de mão firme chamado Pablo. Ele me diz o preço - R$30 a diária por pessoa com café da manhã. Eu digo que estou morto e ele fala, rindo "é, Jalapão não é fácil!". Imediatamente me conquistou. A área do camping é tomada por areia e esqueça sua vidinha limpinha e longe de poeira. Você está lá pra se sujar. Pablo nos convida para jantar, pois havia uns turistas rangando lá mas sobrara bastante comida. Eles cobram R$25,00 por pessoa. Então eu conheço o dono do lugar, o pai de Pablo, seu Emivaldo e sua família toda. Ali já entendemos tudo do Jalapão, costumes, povo, o que fazem, como vivem, onde podemos ir, onde devemos evitar, como é a cidade, como é o negócio ($$$), o que é mentira e o que é verdade. 


                                                       não vi que estava sendo fotografado. 



ENFIM, COMEÇA A EXPEDIÇÃO!

No dia seguinte acordamos bem cedo. Tomamos café e nos informamos das atrações. Nos falaram dos fervedouros (confiem no povo que mora ali, eles sabem mesmo quais são os incríveis). O do Seiça (ou Seixas) é lindo. Pra quem não entende (eu só fui entender pulando dentro de um) fervedouro é uma nascente incansável de água que fica borbulhando e fazendo a areia do fundo se mexer o tempo todo. Você não afunda onde parece ter um buraco. Dá um medinho por alguns segundos, mas é maravilhoso. Esses lugares são propriedades privadas, gente simples a guardam com uma naturalidade de só quem vive ali tem. Os fervedouros custam R$10 para entrar. De graça, na minha opinião. Quanto custa o Wet and Wild? Fomos em tantos fervedouros a ponto de enjoar da atração. 

                                                        S-10! que tanque de guerra!



                                                                     se liga na cor dessa água. 



                                                                     sério... olha isso. 


Depois fomos num lugar que saltava aos nossos olhos na nossa bússola. O nome era "Encontro das Águas". Fica na direção da Comunidade Mumbuca, um povo descendente de escravos que vive basicamente do artesanato do capim dourado. A comunidade é bem simples, silenciosa, gente na rede, galinha pra cá e pra lá, alguns cachorros, motos estacionadas. Nos informamos da direção do "encontro das águas" e pisamos no acelerador. Fomos recebidos timidamente por um cara chamado Coxa. Dei R$15,00 para ele (cada um) para conhecer os fundos da sua propriedade. Ele aponta para onde é e não se dá o trabalho de nos acompanhar. Passamos por uma grande plantação de mandioca (ele vende a R$3,00 o quilo, você pode comprar para fazer no camping que estiver) e por mais vegetações baixas. Curioso: todo lugar de vegetação baixa você ouve bicho se mexendo. Não vi cobras (só uma, morta) e desconfio se tratar de calangos. Damos de frente para um rio com um arame fincado de margem à margem. Não entendo muito bem o que quer dizer e volto para perguntar ao cara como é que eu devo fazer. Ele me diz que eu devo atravessar o rio me guiando pelo arame. Pergunto se não é perigoso e ele diz que todo mundo vai. Volto e aviso minha mulher da nossa aventura. Tiramos os chinelos (um erro, pois o chão de pedras poderia ter rasgado nossos pés) e vamos. Achei a correnteza um pouco forte e não recomendo esse passeio para quem estiver com crianças e idosos. Mas conseguimos e fomos, sem medo, mantendo a calma. Do outro lado andamos mais uns 50 metros e vimos mais um fervedouro. Depois andamos na direção oposta e vimos o encontro dos rios Sono e Formiga. O Sono é mais frio e escuro, o Formiga é mais cristalino e quente. A junção dos dois é inacreditável. Sou do tipo que abre os olhos em baixo da água e toda vez que eu cruzava de um para o outro, além de sentir a diferença da temperatura, percebia a cor. Inesquecível.

                                                        como descrito, acima de mim o Formiga, embaixo o Sono.



                                                                     rio Formiga.



Falando em Formiga, há a cachoeira da Formiga, uma queda que antecede o encontro desses dois rios. Ficava "no caminho" e lá vamos nós. Estrada de areia pra cá, muita areia pra lá e chegamos. Custou R$20,00 por pessoa. Desci do carro e ouvi o barulho dela. Fomos avançando e quando avistamos foi como ver uma miragem. Difícil de acreditar que é liberado o seu mergulho nela. Uma queda tranquila que forma uma piscina cristalina. Leve óculos de mergulho. Eu pedi emprestado para um morador e, gente, parece que foi feito artificialmente. Um verdadeiro aquário para a gente curtir. Depois cria-se um correnteza mais calma abaixo e dá pra passar bons momentos pensando em si. Ouvi dizer que em alta temporada aquilo lota e você não consegue ficar mais do que vinte minutos. Nós demos a sorte de ter pouca gente por ali. Dá pra acampar - R$30,00 por pessoa. Aliás, em quase todas as atrações dá pra você acampar. Vi gente passando uma noite em cada lugar. Nós resolvemos ficar no Beira da Mata pela tamanha cortesia e bom atendimento. Infelizmente acabei me esquecendo de tirar foto da Formiga, pois eu fiquei muito maluco com a perfeição do lugar.



               o riozinho que a Cachoeira da Formiga forma. Dá pra ver um pedacinho dela ali em cima. 





UM ROLÊ (QUASE) SECO. 

No nosso último dia que ainda dormiríamos no Jalapão resolvemos voltar e ver as dunas que havíamos perdido na vinda. Nos informamos com os donos da Beira da Mata e eles nos recomendaram acordar cedo e começar o dia subindo a Serra do Espírito Santo. "Levem água, muita água". Depois queríamos ver as dunas, mas é impossível ir no horário que estaríamos por lá (entre 12h e 13h) e nos informamos que mais pra frente (obviamente fazendo o caminho reverso de nossa ida) teria o Rio Novo que passa em baixo da ponte. Pronto, esse seria nosso passeio de despedida. Nos entupimos de protetor solar. Fomos orientados a subir devagar, beber água devagar e alongar antes de subir a serra. Passamos pelas chapadas ao longe, os paredões da natureza cercado por uma infinidade de serrado. Aos poucos as chapadas vão ficando mais perto e eu descubro que a tal serra nos levaria ao topo de uma delas. Passamos por uma placa indicando a entrada do local e enfrentamos uma estrada estreita de areia. Ali ocorreu minha primeira atolada. Sem desespero (o segredo é não desesperar) coloquei a 4x4 para funcionar na tração mais forte em ré e fiz como me disseram para fazer caso isso acontecesse. Dei ré até um momento em que foi possível pegar a trilha da esquerda (todas as pequenas estradas e trilhas de areia tem mais de uma via, você escolhe a que parece estar melhor) e conseguimos chegar. Mais tarde fiquei sabendo de um casal que atolou pra valer e foi socorrido três horas depois. Estacionamos a S-10 e fomos em direção da subida da Serra do Espírito Santo. 

                                                       lá no fundo as chapadas. é pra lá que fomos. 

Logo no início da subida há uma placa dizendo para não subir sem guia. Ficamos receosos mas até aqui tudo havia dado certo, porque não subir sem? Alongamos e inciamos nossa subida com uma mochila contendo água e algumas frutas. No caminho há alguns banquinhos de madeira para parar e respirar. Na primeira parada vejo a S-10 caber entre meu dedão e indicador. A coisa seria séria. Você vai olhando para cima e para baixo e vai vendo o quão pequeno você é no universo. Tudo aquilo que você vê do carro parece distante, minúsculo. O silêncio é tanto que você não se lembra do barulho dos ônibus e dos carros da sua cidade. A vida parece ser aquilo e pronto. Continuamos nossa subida tomando cuidado para não escorregar no solo de pedras - um deslize ali e a coisa ficaria ruim. Mas sem pressa, subindo e respirando. Numa das paradas resolvo deixar um pouco de peso pra trás. Aos poucos a camionete vai virando um cocô de passarinho e o pico da chapada vai chegando. O que era um sonho do carro vira uma realidade. Você está no topo. Lá em cima uma outra placa dizendo que há uma caminhada de 3km para ver o outro lado. Engatamos num papo para deixar tudo mais natural e fomos. Lá em cima não se vê margem do morro. É só mato. De repente se depara com o mirante. As dunas lá de cima se parece com um borrão. Acho que subimos uns 800 metros. Novamente o mundo pausa. Fotos e mais fotos, videos, água e resolvemos ir embora para continuar a nossa caminhada pelo Jalapão. 


lá do alto. à esquerda o caminho onde atolei a camionete, que está estacionada bem atrás desse matinho da foto. 



                                     



ah, o Jalapão! 


Daí descemos - mais fácil pra respirar, mais difícil para a mente, redobre a atenção - e partimos para o Rio Novo. Nossa água estava pegando fogo e eu queria saber quanto tempo estava o rio. Passamos a entrada das dunas e avistamos uma casinha de pau a pique. Trata-se de um camping e uma espécie de restaurante. Mas o legal mesmo é a dona Benita. Nos recebe com um senhor sorriso. Eu digo que tenho sede e ela diz: "Você quer a água mineral ou a água do Jalapão?". Pergunto a diferença entre as duas e ela diz "a água do Jalapão é a que a gente toma, tamo tudo forte ó". Ela saca duas garrafas trincando de gelada e eu tomo de perder o fôlego. Entre papos e mais dicas, até um cafezinho eu ganho. Saímos de lá e vamos ao encontro do Rio Novo. De um lado da ponte a mais pura beleza. Do outro lado mais beleza. Fica difícil optar por qual lado ir. Fazemos uni duni tê e vamos ao lado da direita. Chegamos lá e pela primeira vez as mutucas começam a me incomodar de fato. Me entupo de repelente e me jogo na água, tomando cuidado para ficar na parte mais rasa do rio. Havia um povo de MG farofando. O problema da farofa? Ela agride... Invade o espaço alheio. Cerca de cinco caras, umas três mulheres e uns pares de crianças. Som no carro no talo - qual a dificuldade de apreciar o silêncio da natureza? - e churrasquinho. Uns imundos, se quer saber. Um crime! A gota d'água foi ver um deles enterrando uma bituca de cigarro. Para não arrumar briga me retiro imediatamente e vamos para a outra margem do rio. Tudo só melhorou. Havia também um povo fazendo farofa, mas uma farofa controlada. Sacos de lixo, silenciosos, educados. Cumprimento e eles me convidam para almoçar. Recuso gentilmente e vou pra água esperar dar o horário de ir para as dunas. Essa galera encontramos mais uma três vezes até o fim da viagem. O rio Novo é grande e bravo. Você vê as águas passando numa velocidade incrível. A gente se banha bem nas margens, onde se forma uma das inúmeras praias. Não sei porque, mas não tenho foto desse trecho. :(



ENFIM, AS DUNAS

Saímos do rio Novo me despedindo do povo educado. "Vocês estão indo para as dunas? Nos encontramos lá". E fomos. Resolvemos dar mais uma parada na dona Benita após ver um carro, dois caras rodeando ele, dona Benita mexendo no que parecia ser o radiador e uma mulher visivelmente incomodada. "É o nosso primeiro dia e já aconteceu isso". Eu a acalmo, dizendo que é assim mesmo e que todo mundo se ajuda. Os caras conseguiram furar o radiador do carro na estrada do Jalapão. Dona Benita enche o radiador do carro de papel higiênico garantindo que eles vão conseguir seguir viagem. Convidamos eles para ir às dunas conosco. Entre várias coisas em comum, descubro que Juca conhece a minha banda Oito Mãos. O cara é de Ribeirão Preto e trabalha num bar chamado Dionísio. Mas voltando... Vamos e enfrentamos 5 km da mais pura e furiosa areia. Eu havia ouvido de tudo, mas a principal dica era me manter na pista da esquerda. A cada mês que passa a coisa muda ali, então se informe para saber em qual será mais fácil a passada. Vou a 60hm/h para não atolar e somos os primeiros a chegar. Deixamos o carro num bolsão e caminhamos mais alguns metros. Então, gente, ela surge. Dourada, enorme, inacreditável: as dunas é de uma beleza indescritível. Vamos caminhando à espera do por do astro rei. Avisto pegadas que julgo ser de Lobo Guará. Infelizmente não cruzei com nenhum. Desse tapete de mais pura areia vejo lá na puta que pariu o pico onde estive mais cedo naquele mesmo dia. O encontro dos olhares, até onde sua limitada vista pode ver, até onde seu limitado sentido pode distinguir entre real e imaginário. Estaria, eu, imaginando?



o infinito


essa foto foi pro meu desktop

mais água no meio do seco

obrigado por mais um dia. 



Não. Eu estava ali, de fato. O Sol foi-se indo, mostrando por um raro momento o quão a vida é perfeita, rara, imponente e preciosa. Estar vivo, naquele pequeno momento, era de uma peculiaridade singular. Sentado em cima de meu chinelo, eu olhava para o sol e tive que esconder uma lágrima. Eu estava agradecido pela minha vida e meu trabalho, por meus amigos e minha família. Um momento desse é hora de se olhar, fazer o balanço, levantar e sacudir. Vamos! Para onde? Para onde o tempo nos deixar, para onde o mundo começar. A terra, mágica e finita, o ar puro e a água - ai, cara, a  água! - me fez encontrar meus sentidos. O corpo não doía, e mente se despedia. Havia muito a continuar, pois a minha vida ali só deu um pequeno encontro com a mais pura forma de criação. Era hora de voltar pra casa. 

Obrigado, Jalapão.