quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

The Endless River




Ando sacando essa coisa de energia. O ano inteiro eu debati sobre isso com qualquer um que se encaixasse no papo. Coisa científica ou não, essa parada de energia existe. Ponha o dedo na tomada e você vai entender. Tome um banho de cachoeira e você vai sentir. Algumas coisas são difíceis de descrever, porque a gente sente. Por exemplo um bumbo na mixagem de uma música. Você passa a ouvi-lo acima dos médios graves. Os sub graves você sente e daí pra frente se tem uma tremenda dificuldade em executar com exatidão esse instrumento da bateria. O show de David Gilmour está sendo difícil de descrever. 

Li alguns artigos e resenhas sobre o acontecimento. O produtor dele disse que o dia 12/12/2015 foi o melhor show de todos os tempos. No UOL analisaram a técnica e a história do guitarrista/cantor do Pink Floyd. Vi uma aí de um cara falando merda das pessoas que pareciam não ter o mesmo conhecimento que ele sobre a obra da banda britânica (na verdade ele só quis dizer o quão ele é foda em conhecer isso ou aquilo e blá blá blá). Conhecimento serve para encantar. David nos encantou. 

Passados dez minutos das 21h, as luzes do estádio do Palmeiras se apagaram e toda a energia canalizada foi liberada. David Gilmour, um senhor com veias saltitantes nas mãos e papo mole branquelo com barba a fazer, surge pequenininho. Veste preto e podemos senti-lo aparecendo no palco. Pra quem, como eu, estava longe, compreendíamos que ele estava ali pelo barulho maravilhoso de uma multidão feliz da vida. Ouve-se o timbre inconfundível. O mesmo dos DVD's, dos discos, dos videos do You Tube. Eu assistia tudo isso a minha vida toda a partir da descoberta do Floyd e pensava "será que um dia vou ver isso?". O sonho estava sendo realizado. 

O delay da guitarra que saía da PA entregava a vitória. O triunfo. David Gilmour estava na minha frente e ao meu lado 40 mil mentes - algumas dispersas, sim, mas outras penetrantes. A sensação ainda é de insegurança. Estou sonhando? A percepção é técnica. Gilmour entoa três canções do seu último disco - o qual eu ouvi PRA CARALHO - e me ligo no som, na luz, na banda, na dinâmica. O show de Gilmour - como nos discos do Pink Floyd - em alguma vezes é baixinho, suave. Em outras vezes uma ensurdecedora massa sonora. 

Então ele toca Wish You Where Here e eu desperto. Gilmour aparece no telão pela primeira vez. Me toco que, de fato, há um deus na minha frente. Desabo como os fanáticos religiosos fazem na igrejas. Aquela é minha igreja. A gente está louvando - não ao homem - mas à arte e à música. Choro que nem criança e abraço minha amiga Giovana e meu novo caro Ramon. A gente se brinda pela eterna lembrança que ali está sendo construída. "How i wish! How i wish you where here!" entoa o estádio. Penso em Berret, em Mason, em Richard e Roger. Penso em mim. Quantas vezes ouvi isso na minha vida e desejei a aparição de um deus do rock?

Daí pra frente é loteria ganha. Felicidade eterna. Money deixa claro sobre ao que o Pink Floyd veio: grana existe e é inevitável, mas não é fonte da verdade. O babaca que gritou "fora Dilma" no banheiro não entendeu nada dos discos. Us And Them é avassaladora. A voz de Gilmour parece não ter sofrido um arranhão sequer.. Ele grita no refrão junto de seus apoios vocais. Mesmo com dois puta backing vocal eu consigo distinguir a inconfundível dicção vocal de Gilmour. 

High Hopes com o violão de nylon tocado no dedo. Nos deixa com o intervalo de 20 minutos e volta arrebentando a boca do balão com Astronomy Domine. Nesse momento eu estou praticamente de frente para o PA. Time e Run Like Hell são momentos de uma assustadora intimidade com a guitarra. Nunca vi nada igual na minha vida. vida. E nunca vou ver. A básica Fender Stratocaster (comprada em 1970) vira um avião na mão do cara. Não houve um sequer errinho humano. Nada! Todas as notas são perfeitas. Todos os bends são exatos. Não há ninguém me minha mente, nesse exato momento, que toque aos pés de David Gilmour. Eu sempre soube que ele era incomparável. 

E o fechamento dos fechamentos. A chave de ouro. Comfortably Numb nunca foi uma das minha preferidas - assim como Creep do Radiohead só foi me pegar no show deles - a faixa do The Wall é o resumo do show de Gilmour. Começa com dinâmica, baixinha, e vai subindo, subindo, subindo, e chega no mar da claridade eterna. Em meio ao solo de guitarra a banda vai se mostrando porque foi contratada. A cada volta de compasso o batera e o baixista arrebentam. Cada virada de tirar os pés do chão. O(s) tecladista(s) faz a cama de som para Gilmour passar. Após incansáveis repetições da sequencia final de acordes e solos, nossos mestre olha para a banda, faz um sinal com o braço da guitarra (mais rock and roll que isso, impossível) e eles terminam no si menor inesquecível. David Gilmour se despede da gente e diz "até a próxima". Será que para mexer com nossas esperanças? Ele volta e eu estarei lá. 

O Pink Floyd é eterno, um rio sem fim. The Endless River.

Foi muito gratificante. Foi uma demonstração de carinho.

Obrigado, David. 




terça-feira, 14 de julho de 2015

Jalapão - Tocantis, Brasil.



                                                       O planeta Terra, Jalapão. 


O Jalapão é logo ali. 

Esse post é carinhosamente direcionado aos que, como eu e minha mulher, desejaram (desejam) fazer essa viajem e não encontram muitas informações sobre esse lugar único no planeta Terra. Aliás, a Terra é um planeta perfeito. Estar no Jalapão é confirmar a prática dessa teoria. Inúmeras vezes eu pensei "mas poque olhamos tanto para fora do nosso sistema?". Nosso planeta - nosso Brasil - é de uma peculiaridade infinita. O Jalapão, por mais finito que seja, nos dá a sensação de que o universo é, de fato, sem fim.

Começamos nossa viagem planejando muito (não tão bem, essa é a graça) o que faríamos. Onde dormiríamos? Com quem iríamos? Como faríamos? Optamos, logo de cara, em ignorar por completo os falsos avisos dos pseudos guias que há nas poucas agências (sic) de viagem. Tudo nas mãos desses caras é caro. Me lembro de ligar para hotéis em Palmas para ter informações mais concretas e nada era dito sem antes depositar alguma grana para reservas e mais reservas. Via-se no site do Korubo que aquilo é para gente rica. Começamos a pensar que o Jalapão era para ricos (como tudo que há de belo nesse planeta, o povo gourmet tem mania de achar que é privilégio deles) Esqueçam! Korubo fica num lugar limitado e te limitam a explorar, errar, suar, atolar, rir e conhecer o maravilhoso povo local. Nada contra essa galera, mas não venham dizer que só por essa agência é possível conhecer o grande Jalapo, porque isso é mentira! 

Ou então os campings com seus guias e suas 4x4, com tudo a vontade, comida, bebida, etc... Tudo caríssimo! Pra quem tem $ e não quer suar a camisa, ok... Fique à vontade. Pra quem, como nós, gosta de fazer as coisas no seu tempo, no seu roteiro, perguntando, errando e acertando, continue lendo!

Nossa atenção foi despertada pelos fóruns sobre o Jalapão e uma coisa é certa: vá de 4x4. Os moradores locais conseguem andar com o carro que for, mas você não mora lá. É primordial um veículo forte, confortável, com ar-condicionado (no meio do nada a 36°, em pleno meio dia). E ir sozinho (sem guias) é uma experiência ímpar. Primeiro: guias são chatos e muitos deles arrogantes. Os verdadeiros guias não te cobram nada para te dizer a direção certa e a quilometragem para essa ou outra cachoeira. Os moradores de Mateiros são gente simples e sorridentes, sentem felicidade em receber você. 

Estudamos a melhor forma de ir e fizemos o seguinte: saímos de Campinas num voo para Palmas com escala em Brasília. Em Palmas, ainda no aeroporto alugamos uma S10 4x4 da empresa Unidas (justos e corretos). Façam as contas e verão que sai mais barato do que os absurdos R$500 a diária que te pedem para dar os rolês. De Palmas fomos até Ponte Alta do Tocantis, passando por Taquaralto e Taquaruçu. Não se hospede definitivamente em Ponte Alta. As coisas realmente fantásticas estão em Mateiros. O Jalapão é uma região que agrupa vários municípios, é confuso daqui, mas lá você entende perfeitamente. E em três dias você entende que todo município puxa a sardinha pro seu lado dizendo "o Jalapão é aqui"... Mas confie, é em Mateiros que rola a coisa toda. 

Você vai perceber que quilometragem é algo meio chutado pelas placas e que 150 quilômetros na cidade é uma coisa, no Jalapo é outra história. Não interessa a hora que você vai sair: leve água (muita, uns 2 litros para cada tripulante) almoce antes de pegar a estrada para Mateiros. Almoçamos em Ponte Alta no restaurante que fica na beira do rio que passa em baixo da tal ponte. Somos veganos e nos saímos muito bem. Se você come carne, cara, você vai sair de lá rolando. A culinária Jalapoeira consiste basicamente em salada de repolho temperada com coentro (maravilhoso), frango caipira (qualquer lugar que você parar você vai ver capirinhas pretos ciscando), arroz, feijão, mandioca (frita ou cozida) e macarrão alho e óleo. Você tem que reservar porque eles não se organizam como o sistema paulista diz, eles fazem do jeito deles e é você que tem que se adaptar. Claro, eles cozinham além do que precisam então sempre tem janta sobrando, duvido que você vai dormir com fome se chegar sem avisar. Em Ponte Alta, por exemplo, cheguei assim "Oi, tem almoço?". 

Ainda em Ponte Alta abasteci a camionete e pedi informações. O posto que fica de frente para o começo da estrada tem um cara muito legal. O nome dele é Cléber e nos ensinou quase tudo que precisávamos. Viu nosso carro e disse "Vai enfrentar o Jalapão?". Eu não acreditava ainda nessa coisa de enfrentar, mas só depois que você entra na estrada você entende.  "Vai na maciota, deixa traçado daqui até lá. Passe na cachoeira da Velha, que fica a 90km de Mateiros e se banhe na praia que forma logo em seguida dela. Você vai chegar à noite em Mateiros". Ele tinha um mapa pendurado e tiramos uma foto. Foi isso que usamos como bússola na viagem toda. Disseram que celular não pegava - é verdade. Disseram que GPS não pega - não sei, não levei, mas alguns GPS trabalham no modo off-line. Disseram que não tinha placa. MENTIRA! Pra tudo tem placa. É o ganha pão deles, é o turismo. A coisa funciona. 

                                                       nossa bússola


A GRANDE E SINUOSA ESTRADA DE TERRA DO JALAPÃO! 

Fomos e por algumas horas a estrada de areia (sim, areia. Algumas vezes parece terra por estar agrupada e de cor escura, mas o cerrado é feito de areia) nos parece tranquila, vou a 70km/h. Logo percebo que não estou nas estradinhas de chão que pego perto de casa. O solo começa a ficar ruim mesmo e nas costelas (ondulações que fazem teu 4x4 tremer feito vara verde) perdemos uma lanterna traseira, que caiu despercebidamente e foi engolida pelo pó que fica pra trás. Imediatamente você é cercado por um mar de vegetação do cerrado de um lado e do outro e tudo que tem à sua frente são quilômetros e quilômetros de estrada de terra (de novo, é areia!). Você já começa a pensar que se teu carro quebrar você tá ferrado. Isso tem sua verdade, pois a densidade de ser humano nesse lugar é muito pequena. Dê um google e você vai entender. Mas sempre tem gente passando. E há uma coisa no Jalapão que pra quem é de São Paulo ou de cidades grandes costuma sofrer para aceitar: lá as pessoas se ajudam. Com alguma hora de estrada somos surpreendidos por duas pessoas numa moto. Eles percebem que estamos inseguros (estávamos parado lendo uma placa de uma propriedade privada) e param. Já pensei "ferrou". Ele vem ao meu lado e eu digo, sem jeito "Mateiros, é pra lá? Tá certo?". O cara diz "Isso mesmo, tantos quilômetros nessa direção". Sorri e vai embora. Lá todo local anda de moto. Não atola e é barato para eles. Então você vai ver de senhorinhas a garotões com sua pele marcada de sol encobrando a estrada hostil do Jalapo. Não tem como se perder, é só ficar na estrada principal, que é inconfundível. 

Depois de passar por uma subida avassaladora, na qual no topo tem um pequeno pedaço de asfalto (seria impossível passar sem isso) chegamos à entrada da Cachoeira da Velha - mais 29 km fora da estrada principal. Vale a pena! Faz parte tudo ser longe e o prêmio é sempre compensador. Você passa por uma grande casa (que me disseram ter sido construída por Pablo Escobar, o Jalapão já foi rota de drogas, mas eu paro por aqui sobre essas curiosidades porque a graça é descobrir perguntando aos amigos de Mateiros que vão surgindo) e no meio da estrada há um cara parado segurando um celular. Descobrimos se passar por uma espécie de fiscal. Conta quantos entram para ninguém acampar lá dentro. É proibido. Ele nos saúda e diz que podemos ficar até 17h30 e que nos espera na volta. Descemos (no Jalapão não existe esquerda, reto ou direita mas sim desce ou sobe) até a cachoeira e ela é de dar medo. Um barulho forte, muita água e aquilo é para se ver. Fotos, filmagens, maravilhoso. Daí você desce até a prainha que esse rio forma. Aqui começa o Jalapão, no sentido da surpresa. Entre tanto pó e secura há uma praia! Coisa mais linda do mundo. Banhamos e continuamos viagem. Faltavam 90km para Mateiros. 


                                                       tem placa sim! 


                                                       cachoeira da velha


                                                       oi! esse sou eu, na praia do serrado. 




Seguimos viagem e, cara, cansamos! Ainda bem que almoçamos antes. Era de noite quando passamos pelas dunas e resolvemos que iríamos voltar outra hora. Na escuridão a gente percebeu que as grandes montanhas que formam as chamadas chapadas estavam sendo iluminadas por alguma coisa atras delas. Mas o quê? Antes mesmo de perguntar lá estava ela, a Lua cheia. Esqueçam fotos. Vimos uma lua que só no Jalapão, de noite, foi possível. Fomos abençoados.  Chegamos em Mateiros mortos de cansaço, com fome e ansiosos por saber onde iríamos dormir. Não reservamos nada, pois na internet só há informação da galera que tem pousada, uma média de R$150 por noite com café da manhã. Paramos no posto da cidade (há dois, gasolina a R$4,90 o litro e diesel a R$3,80, caro porque a estrada pra chegar lá, convenhamos, encarece tudo, menos o coração do verdadeiro cidadão de Mateiros) e perguntamos onde há um camping por ali. Ah é! Levamos barracas, por dois motivos: baratear nossa viagem e tirar de vez da minha cabeça que acampar é coisa pra maluco. Confesso que dormir dentro de uma barraca foi um pouco desconfortável. Eu meço 1,80 e sou gordo. Já viu né... Mas nos fins dos dias eu estava tão morto que só de encostar eu adormecia. Voltando... Um cara no posto nos disse de um Camping que estava a 3 km de nós. Não sabíamos sequer a direção e o cara ofereceu para nos levar, seguindo o carro dele, até a primeira placa de identificação do lugar (aí a hospitalidade deles de novo) e fomos ao Beira da Mata. Fui recebido pela cadela mais linda do Jalapão, a Cacau. Depois veio o dono dela, um garoto bonito de aperto de mão firme chamado Pablo. Ele me diz o preço - R$30 a diária por pessoa com café da manhã. Eu digo que estou morto e ele fala, rindo "é, Jalapão não é fácil!". Imediatamente me conquistou. A área do camping é tomada por areia e esqueça sua vidinha limpinha e longe de poeira. Você está lá pra se sujar. Pablo nos convida para jantar, pois havia uns turistas rangando lá mas sobrara bastante comida. Eles cobram R$25,00 por pessoa. Então eu conheço o dono do lugar, o pai de Pablo, seu Emivaldo e sua família toda. Ali já entendemos tudo do Jalapão, costumes, povo, o que fazem, como vivem, onde podemos ir, onde devemos evitar, como é a cidade, como é o negócio ($$$), o que é mentira e o que é verdade. 


                                                       não vi que estava sendo fotografado. 



ENFIM, COMEÇA A EXPEDIÇÃO!

No dia seguinte acordamos bem cedo. Tomamos café e nos informamos das atrações. Nos falaram dos fervedouros (confiem no povo que mora ali, eles sabem mesmo quais são os incríveis). O do Seiça (ou Seixas) é lindo. Pra quem não entende (eu só fui entender pulando dentro de um) fervedouro é uma nascente incansável de água que fica borbulhando e fazendo a areia do fundo se mexer o tempo todo. Você não afunda onde parece ter um buraco. Dá um medinho por alguns segundos, mas é maravilhoso. Esses lugares são propriedades privadas, gente simples a guardam com uma naturalidade de só quem vive ali tem. Os fervedouros custam R$10 para entrar. De graça, na minha opinião. Quanto custa o Wet and Wild? Fomos em tantos fervedouros a ponto de enjoar da atração. 

                                                        S-10! que tanque de guerra!



                                                                     se liga na cor dessa água. 



                                                                     sério... olha isso. 


Depois fomos num lugar que saltava aos nossos olhos na nossa bússola. O nome era "Encontro das Águas". Fica na direção da Comunidade Mumbuca, um povo descendente de escravos que vive basicamente do artesanato do capim dourado. A comunidade é bem simples, silenciosa, gente na rede, galinha pra cá e pra lá, alguns cachorros, motos estacionadas. Nos informamos da direção do "encontro das águas" e pisamos no acelerador. Fomos recebidos timidamente por um cara chamado Coxa. Dei R$15,00 para ele (cada um) para conhecer os fundos da sua propriedade. Ele aponta para onde é e não se dá o trabalho de nos acompanhar. Passamos por uma grande plantação de mandioca (ele vende a R$3,00 o quilo, você pode comprar para fazer no camping que estiver) e por mais vegetações baixas. Curioso: todo lugar de vegetação baixa você ouve bicho se mexendo. Não vi cobras (só uma, morta) e desconfio se tratar de calangos. Damos de frente para um rio com um arame fincado de margem à margem. Não entendo muito bem o que quer dizer e volto para perguntar ao cara como é que eu devo fazer. Ele me diz que eu devo atravessar o rio me guiando pelo arame. Pergunto se não é perigoso e ele diz que todo mundo vai. Volto e aviso minha mulher da nossa aventura. Tiramos os chinelos (um erro, pois o chão de pedras poderia ter rasgado nossos pés) e vamos. Achei a correnteza um pouco forte e não recomendo esse passeio para quem estiver com crianças e idosos. Mas conseguimos e fomos, sem medo, mantendo a calma. Do outro lado andamos mais uns 50 metros e vimos mais um fervedouro. Depois andamos na direção oposta e vimos o encontro dos rios Sono e Formiga. O Sono é mais frio e escuro, o Formiga é mais cristalino e quente. A junção dos dois é inacreditável. Sou do tipo que abre os olhos em baixo da água e toda vez que eu cruzava de um para o outro, além de sentir a diferença da temperatura, percebia a cor. Inesquecível.

                                                        como descrito, acima de mim o Formiga, embaixo o Sono.



                                                                     rio Formiga.



Falando em Formiga, há a cachoeira da Formiga, uma queda que antecede o encontro desses dois rios. Ficava "no caminho" e lá vamos nós. Estrada de areia pra cá, muita areia pra lá e chegamos. Custou R$20,00 por pessoa. Desci do carro e ouvi o barulho dela. Fomos avançando e quando avistamos foi como ver uma miragem. Difícil de acreditar que é liberado o seu mergulho nela. Uma queda tranquila que forma uma piscina cristalina. Leve óculos de mergulho. Eu pedi emprestado para um morador e, gente, parece que foi feito artificialmente. Um verdadeiro aquário para a gente curtir. Depois cria-se um correnteza mais calma abaixo e dá pra passar bons momentos pensando em si. Ouvi dizer que em alta temporada aquilo lota e você não consegue ficar mais do que vinte minutos. Nós demos a sorte de ter pouca gente por ali. Dá pra acampar - R$30,00 por pessoa. Aliás, em quase todas as atrações dá pra você acampar. Vi gente passando uma noite em cada lugar. Nós resolvemos ficar no Beira da Mata pela tamanha cortesia e bom atendimento. Infelizmente acabei me esquecendo de tirar foto da Formiga, pois eu fiquei muito maluco com a perfeição do lugar.



               o riozinho que a Cachoeira da Formiga forma. Dá pra ver um pedacinho dela ali em cima. 





UM ROLÊ (QUASE) SECO. 

No nosso último dia que ainda dormiríamos no Jalapão resolvemos voltar e ver as dunas que havíamos perdido na vinda. Nos informamos com os donos da Beira da Mata e eles nos recomendaram acordar cedo e começar o dia subindo a Serra do Espírito Santo. "Levem água, muita água". Depois queríamos ver as dunas, mas é impossível ir no horário que estaríamos por lá (entre 12h e 13h) e nos informamos que mais pra frente (obviamente fazendo o caminho reverso de nossa ida) teria o Rio Novo que passa em baixo da ponte. Pronto, esse seria nosso passeio de despedida. Nos entupimos de protetor solar. Fomos orientados a subir devagar, beber água devagar e alongar antes de subir a serra. Passamos pelas chapadas ao longe, os paredões da natureza cercado por uma infinidade de serrado. Aos poucos as chapadas vão ficando mais perto e eu descubro que a tal serra nos levaria ao topo de uma delas. Passamos por uma placa indicando a entrada do local e enfrentamos uma estrada estreita de areia. Ali ocorreu minha primeira atolada. Sem desespero (o segredo é não desesperar) coloquei a 4x4 para funcionar na tração mais forte em ré e fiz como me disseram para fazer caso isso acontecesse. Dei ré até um momento em que foi possível pegar a trilha da esquerda (todas as pequenas estradas e trilhas de areia tem mais de uma via, você escolhe a que parece estar melhor) e conseguimos chegar. Mais tarde fiquei sabendo de um casal que atolou pra valer e foi socorrido três horas depois. Estacionamos a S-10 e fomos em direção da subida da Serra do Espírito Santo. 

                                                       lá no fundo as chapadas. é pra lá que fomos. 

Logo no início da subida há uma placa dizendo para não subir sem guia. Ficamos receosos mas até aqui tudo havia dado certo, porque não subir sem? Alongamos e inciamos nossa subida com uma mochila contendo água e algumas frutas. No caminho há alguns banquinhos de madeira para parar e respirar. Na primeira parada vejo a S-10 caber entre meu dedão e indicador. A coisa seria séria. Você vai olhando para cima e para baixo e vai vendo o quão pequeno você é no universo. Tudo aquilo que você vê do carro parece distante, minúsculo. O silêncio é tanto que você não se lembra do barulho dos ônibus e dos carros da sua cidade. A vida parece ser aquilo e pronto. Continuamos nossa subida tomando cuidado para não escorregar no solo de pedras - um deslize ali e a coisa ficaria ruim. Mas sem pressa, subindo e respirando. Numa das paradas resolvo deixar um pouco de peso pra trás. Aos poucos a camionete vai virando um cocô de passarinho e o pico da chapada vai chegando. O que era um sonho do carro vira uma realidade. Você está no topo. Lá em cima uma outra placa dizendo que há uma caminhada de 3km para ver o outro lado. Engatamos num papo para deixar tudo mais natural e fomos. Lá em cima não se vê margem do morro. É só mato. De repente se depara com o mirante. As dunas lá de cima se parece com um borrão. Acho que subimos uns 800 metros. Novamente o mundo pausa. Fotos e mais fotos, videos, água e resolvemos ir embora para continuar a nossa caminhada pelo Jalapão. 


lá do alto. à esquerda o caminho onde atolei a camionete, que está estacionada bem atrás desse matinho da foto. 



                                     



ah, o Jalapão! 


Daí descemos - mais fácil pra respirar, mais difícil para a mente, redobre a atenção - e partimos para o Rio Novo. Nossa água estava pegando fogo e eu queria saber quanto tempo estava o rio. Passamos a entrada das dunas e avistamos uma casinha de pau a pique. Trata-se de um camping e uma espécie de restaurante. Mas o legal mesmo é a dona Benita. Nos recebe com um senhor sorriso. Eu digo que tenho sede e ela diz: "Você quer a água mineral ou a água do Jalapão?". Pergunto a diferença entre as duas e ela diz "a água do Jalapão é a que a gente toma, tamo tudo forte ó". Ela saca duas garrafas trincando de gelada e eu tomo de perder o fôlego. Entre papos e mais dicas, até um cafezinho eu ganho. Saímos de lá e vamos ao encontro do Rio Novo. De um lado da ponte a mais pura beleza. Do outro lado mais beleza. Fica difícil optar por qual lado ir. Fazemos uni duni tê e vamos ao lado da direita. Chegamos lá e pela primeira vez as mutucas começam a me incomodar de fato. Me entupo de repelente e me jogo na água, tomando cuidado para ficar na parte mais rasa do rio. Havia um povo de MG farofando. O problema da farofa? Ela agride... Invade o espaço alheio. Cerca de cinco caras, umas três mulheres e uns pares de crianças. Som no carro no talo - qual a dificuldade de apreciar o silêncio da natureza? - e churrasquinho. Uns imundos, se quer saber. Um crime! A gota d'água foi ver um deles enterrando uma bituca de cigarro. Para não arrumar briga me retiro imediatamente e vamos para a outra margem do rio. Tudo só melhorou. Havia também um povo fazendo farofa, mas uma farofa controlada. Sacos de lixo, silenciosos, educados. Cumprimento e eles me convidam para almoçar. Recuso gentilmente e vou pra água esperar dar o horário de ir para as dunas. Essa galera encontramos mais uma três vezes até o fim da viagem. O rio Novo é grande e bravo. Você vê as águas passando numa velocidade incrível. A gente se banha bem nas margens, onde se forma uma das inúmeras praias. Não sei porque, mas não tenho foto desse trecho. :(



ENFIM, AS DUNAS

Saímos do rio Novo me despedindo do povo educado. "Vocês estão indo para as dunas? Nos encontramos lá". E fomos. Resolvemos dar mais uma parada na dona Benita após ver um carro, dois caras rodeando ele, dona Benita mexendo no que parecia ser o radiador e uma mulher visivelmente incomodada. "É o nosso primeiro dia e já aconteceu isso". Eu a acalmo, dizendo que é assim mesmo e que todo mundo se ajuda. Os caras conseguiram furar o radiador do carro na estrada do Jalapão. Dona Benita enche o radiador do carro de papel higiênico garantindo que eles vão conseguir seguir viagem. Convidamos eles para ir às dunas conosco. Entre várias coisas em comum, descubro que Juca conhece a minha banda Oito Mãos. O cara é de Ribeirão Preto e trabalha num bar chamado Dionísio. Mas voltando... Vamos e enfrentamos 5 km da mais pura e furiosa areia. Eu havia ouvido de tudo, mas a principal dica era me manter na pista da esquerda. A cada mês que passa a coisa muda ali, então se informe para saber em qual será mais fácil a passada. Vou a 60hm/h para não atolar e somos os primeiros a chegar. Deixamos o carro num bolsão e caminhamos mais alguns metros. Então, gente, ela surge. Dourada, enorme, inacreditável: as dunas é de uma beleza indescritível. Vamos caminhando à espera do por do astro rei. Avisto pegadas que julgo ser de Lobo Guará. Infelizmente não cruzei com nenhum. Desse tapete de mais pura areia vejo lá na puta que pariu o pico onde estive mais cedo naquele mesmo dia. O encontro dos olhares, até onde sua limitada vista pode ver, até onde seu limitado sentido pode distinguir entre real e imaginário. Estaria, eu, imaginando?



o infinito


essa foto foi pro meu desktop

mais água no meio do seco

obrigado por mais um dia. 



Não. Eu estava ali, de fato. O Sol foi-se indo, mostrando por um raro momento o quão a vida é perfeita, rara, imponente e preciosa. Estar vivo, naquele pequeno momento, era de uma peculiaridade singular. Sentado em cima de meu chinelo, eu olhava para o sol e tive que esconder uma lágrima. Eu estava agradecido pela minha vida e meu trabalho, por meus amigos e minha família. Um momento desse é hora de se olhar, fazer o balanço, levantar e sacudir. Vamos! Para onde? Para onde o tempo nos deixar, para onde o mundo começar. A terra, mágica e finita, o ar puro e a água - ai, cara, a  água! - me fez encontrar meus sentidos. O corpo não doía, e mente se despedia. Havia muito a continuar, pois a minha vida ali só deu um pequeno encontro com a mais pura forma de criação. Era hora de voltar pra casa. 

Obrigado, Jalapão. 





quarta-feira, 24 de junho de 2015

Sobre defecar (ou cagar).

Minha primeira pergunta é: porque temos tanta vergonha em assumir que cagamos? Ou, pior, que estamos cagando? Eu sempre tento ilustrar meus post's, mas por um motivo óbvio esse não terá fotos - afinal todo mundo sabe como é o cocô. Rogério Skylab falou uma verdade absoluta! "Todo mundo olha para a própria merda depois de dar um cagão". Um personagem do falecido José Wilker disse uma frase que eu adoro celebrar em casa: "Vocês me dão licença que eu vou dar uma cagada".

Hoje de manhã eu estava zapeando o rádio e passei pela Joven Pan. Estavam falando sobre os lugares mais curiosos que já fizeram amor. E pensei "mas por que não falam sobre os lugares mais estranhos que cagaram?". Eu tenho o dom de cagar em lugares incrivelmente impróprios.

Meu sogro é caminhoneiro e sustentou seus filhos com esse ofício. Certa vez eu tive que dar um rolê de um dia inteiro com ele e nunca me esquecerei... Lá pelas quatro da tarde, em São Paulo, na puta que pariu, me deu vontade de ir ao banheiro. Acontece que estávamos numa fábrica onde ele fazia entrega e havia aquelas privadas no chão. Alguém me disse se tratar de banheiro alemão... Sei não! Só sei que você caga em pé. E se limpa em pé. É foda.

A natureza não chama. Intima! Uma vez eu estava na praia, era inverno. Fui intimado e não havia um banheiro num raio de 10 quilômetros. Dizem que o mar é o banheiro da humanidade. Foi a solução.

Viajando para o Rio, faltava uns 30 minutos e fui, mais uma vez, intimado! Um posto escroto de beira de estrada me chamou a atenção. Tirem as crianças da sala. Fui correndo para o banheiro e nem vi se tinha papel higiênico. Só depois fui perceber que minha jornada só estava começando: não havia papel. A meia ficou lá.

Esses dias eu estava tocando num bar e fui intimado no meio do intervalo. Graças a deus era intervalo. Fui ao banheiro e saquei meu smatphone (todo mundo faz isso). Daí entrou dois caras e um deles tentou abrir o único reservado que havia para cagar. Eu disse "opa, tô usando mano". Daí o cara se desculpou e ficou batendo papo com o outro. Eu ouvi a expressão "é foda" e eu disse "foda é cagar no bar". Todo mundo riu. "Foda é cagar na balada". Rimos de novo. "Um amigo meu cagou no Paulistão!" um deles disse. Se eu tivesse no Wodstock, tava extremamente fudido.

Uma vez fui pra São Thomé das Letras e na ida também tive que cagar num posto. Odeio cagar em posto. Mas é melhor que cagar na calça. Chegando lá percebemos que havia apenas um banheiro na casa para 10 pessoas (Maria Bethânia, minha vira-lata, não contava, ela cagou no quintal). Imediatamente criamos o código do "fui intimado". Quem era intimado tinha direito ao banheiro imediatamente.

Mas você pode estar pensando que eu sou um nojento idiota que fala sobre cagar. Não seja hipócrita. Todo mundo caga. E ainda não entendi porque temos vergonha de assumir isso.


segunda-feira, 15 de junho de 2015

Papeando sobre Game Of Thrones.


ATENÇÃO!!! SPOILERS A SEGUIR!
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Acabo de ver o último episódio da quinta temporada de Game Of Thrones sabendo da morte de John Snow. Num primeiro momento eu fiquei muito puto por dar atenção a uma coisa tão inútil. Mas depois eu pensei que a minha braveza fazia sentido, afinal estamos falando de arte.

Ás vezes acho Breaking Bad a melhor série de todas, daí mudo para The Walking Dead e já achei Boardwalk Empire fodástica. Hoje acho Game Of Thrones a melhor coisa de todos os tempos. Eles têm esse poder após o final de cada temporada. Da última vez, eu não conseguia dormir após a morte de Rob Stark e sua noiva grávida. Pensando desse jeito, até que foi bom saber da morte de John Snow. Fica a pergunta: Os Starks nasceram para se foder? John era mais Stark que próprio Rob, segundo minha doideira. Mas traidores são traidores e até isso é um ponto de vista. John acreditava num ideal, para isso negou os ideais de alguns e sentiu na pele o peso da bondade. Na muralha quem são os selvagens? É preciso ir longe para ver o real perigo. John foi e o mal o tocou, não deu outra. Eu fazia minhas apostas quanto a morte dele e Martin está começando a ficar previsível. Qual é a dele, nos tirar a esperança?

Mas é claro que Stannis ia se danar. Um babaca, sem fé e sem coragem. Juro que apostei nele, mas não torci por ele. Eu torço pela justiça e ainda acho que um Stark vai nos brindar. Aria foi perfeita em se tornar uma assassina. Que cena! A perda da sua visão vai trazer algo à tona. Aposto que os caras (o deus das muitas faces) querem apurar seus sentidos. Ela vai ficar imbatível. 

Theon Greyjoy por uns minutos se tornou o John Snow que todos esperávamos - nos deu um sopro de esperança ao saltar com Sansa para as profundezas fofas da neve. 

E eu não sei exatamente o que senti ao ver Cersei Lannister numa situação tão humilhante. Sim, ela colheu o que plantou, mas não foi um pouco demais? Eu não sei... Que jogue a primeira pedra quem não deu uma torcida por ela e pensou "agora a porra vai ficar séria" depois que aquele grandão a pegou no colo? Cara, a sexta temporada vai pegar fogo (nos dois últimos episódios, é claro).

Por fim, nossa querida Deanerys, mãe dos dragões, poderosa que perde para si mesma, não consegue dominar a arte da administração, é cercada pelos Dothraki e nenhuma pista é deixada. Eu acho que os caras vão louvá-la... E ela vai voltar à cidade e a parada vai ficar sinistra. 

Já ficou claro que o principal perigo vem do frio. Sabemos que Aço Viliriano, que andava nas mãos do grandioso Ned Stark, é o responsável por destruir os caminhantes brancos. Nem precisamos saber a razão disso. O jogo só está começando e a arte imita a vida: quanto mais fiel aos seus princípios, mais você se fode. 

E por onde anda Bran Stark?!?! 

sexta-feira, 15 de maio de 2015

Os clipes da Oito Mãos.

Vi um vídeo de Noel Gallagher falando sobre os clipes do Oasis e me senti inspirado a fazer o mesmo com a banda na qual participei. Esse será um post longo, então a intro é só isso.



História de Outra Vez


Tudo era feito por nós. Até o fim de 2014 ainda era desse jeito. Jamais fomos de deixar algo nas mãos de um especialista e sempre nos julgamos especialistas em tudo. A verdade é que nosso lixo era sincero. Esse clipe foi gravado na casa que o Bier morou na infância, pisos de taco que ressoam o caminhar - daí que ele tirou "passo a passo, estalam as pontes sobre o magma de uma antiga infância inventada". Foi um dia feliz, todos se amavam. Adhemar era o nosso baterista e eu ali metendo o dedo em tudo quanto era canto que não era chamado. Eu fumava um cigarro atras do outro. Eles tocaram pra valer a música enquanto filmavam. Arrumamos uma caixa com potência e ligamos o material que gravamos no Basement com o Tarcísio Jr. e Caio Ribeiro. Publio editou, sempre teve paciência pra essas paradas e sempre foi ele quem cuidou dessa coisa de edição visual - as capas dos dois discos são obras dele. 


Guarde a Última Dança



Não sei de quem foi a ideia. Só sei que começamos a falar sobre sair fazendo filmagens de casais dançando em festas de formatura, casamento, baile da terceira idade, rastapé, a puta que pariu... Fomos deixando a coisa de lado porque ia dar um trampo da porra, e ninguém queria ter esse trabalho pra si. Alguém teve a ideia de roubar cenas de filmes famosos e uma amiga do Bier - Ruth Almeida -  fez o trampo que ninguém queria pra si... Quem viu essa música ao vivo insistia em dizer que era a melhor canção da banda - mesmo depois do lançamento de Aliás. 



Oito Mãos na Pucc




Isso não é um clipe, eu sei. Mas tem história. Eu não queria por nada nesse mundo participar dessa bosta, mas eles estavam aceitando até velório para tocar. Tentei fazer a cabeça deles (como todas as vezes que eu tinha uma opinião diferente, quem nunca?) mas eles nem deram bola. Iriam com ou sem eu. Foi o Adhemar quem arrumou essa roubada dizendo "pô, são os caras da Pucc, é uma oportunidade". Sempre caguei pra esse papo de oportunidade. Eu sabia no que estávamos se metendo. Eu fazia Pucc nessa época e foi nesse palco que fizemos nossa prova de Expressão da Comunicação, que nada mais era do que uma peça de teatro. Eu sabia que os técnicos da Pucc apareceriam com um microfone de lapela para nos captar e sabia que teríamos que tocar no volume 1. E também sabia que isso era um exercício de alguém ali inserido na Pucc. Acho que foi ao ar na TV PUCC. 


Claire



Pra você ter uma noção de como eu era (sou) escroto, o vídeo abre com um esporro meu: "Isso é um ensaio, não é uma gravação". Bier dá um sorriso sem graça e posso ouvir o pensamento do André. Mas o que eu gosto nesse vídeo são os elementos - minha Cort na mão do André; esse local na casa do André - onde foi gravado Vejo Cores; Adhemar na bateria - apesar de não ser um puta batera, era um cara divertido de trabalhar junto; o Zé irmão do Adhemar (que está filmando); e lembrar que eu tinha disposição de levantar as 9am dum sábado para ensaiar. Os vizinhos da Querubim Uriel deveriam querer nossa prisão. Claire é incrível, em qualquer situação. 


Passarinho



Vejo Cores Nas Coisas não tem um clipe decente. A gente ainda meio que não se atentava aos detalhes técnicos. Passarinho é um presente. Esse clipe é outra manifestação da felicidade de se ter uma banda e fazer as coisas juntos. Percebe-se no olhar do André a coisa toda. O desenho do Publio... Nossas ideias eram assim. A capa de Vejo Cores é assim. Eu morava com meus pais e ficava na casa do André até uma da matina. Com certeza essa filmagem foi feita depois das 23h e Cida (a mãe do André) já deveria estar sonhando e acho que Passarinho foi a trilha. 



Grave Lacuna



A gente tinha dúvidas quanto a nossa qualidade artística. Quer dizer, será que tínhamos? Falando por mim, eu acho que sim... Ninguém nunca disse nada, nossos shows eram para poucas pessoas interessadas e nossa luta era mais para ter um lugar ao sol do que para se sentir vivo. Não tínhamos um puto para investir - veja nossos videos até então. Até que nos inscrevemos em dois festivais: Cena Musical Independente, organizado pela secretaria de cultura do estado de SP e o Unifest Rock, organizado pelo Marks, o cara do rolê independente de Campinas. No primeiro, com sede em São Sebastião, eu só queria ficar doidão o tempo todo e curtir a brisa de ser a única banda de Campinas e conseguir estar lá. Nosso prêmio foi investido nos equipamentos necessários para gravar o Vejo Cores. Nunca me senti tão bem na vida como aqueles dois dias no litoral. Recebi a notícia de ter sido aceito no festival pelo meu querido Elthon Dias. Levei champagne no ensaio para comemorar nossa primeira conquista - a disputa era ser selecionado, o prêmio era garantido. No Unifest (o vídeo acima) foi mais legal ainda, porque foi aqui na cidade. Uns caras olharam torto para nós. Foda-se. Eu sentia, no meio da apresentação, que éramos uma banda FODA e que nada tiraria isso da minha cabeça. Foi aí que fiquei aliviado.Ganhamos - acho que o quarto ou terceiro lugar - e o prêmio foi usado para prensar Vejo Cores Nas Coisas. Grave Lacuna foi uma explosão escrita por André que nos levou a um novo degrau. 


Passo a Passo



O Ailás começou assim: nos inscrevemos nesses esquemas de incentivo cultural e rolou. Tínhamos um objetivo de fazer uns shows pelo estado e tínhamos direito à nossa parte. Mais uma vez, investimos. Eu havia saído da banda e o Adhemar também. Me chamaram de volta para assumir as baquetas e eu aceitei. Esse clipe inaugura nossa leva de clipes de verdade. Foi dirigido pelo Tita (Christian Camilo) e foi um dia maravilhoso no apartamento que o Bier morava em Sampa - o apartamento do Sol. A luz ali é incrível. Eu tava numa ressaca monstro, mas conservava um bom humor. Na verdade eu bebi na noite anterior porque estava feliz por fazer parte da banda. A ideia foi exatamente o que aparece - filmar a gente fazendo a capa de Aliás. Capa essa que veio da neurose de Bier em anotar as coisas de sua pesquisa de Guimarães Rosa em post it. Cheio de discos de vinis (Bier herdou a discoteca do pai) passamos uma tarde ouvindo tudo. Teve cerveja, cigarro de palha, café, cigarro de amêndoas e poucos takes dublando um alto falante de I-Pad - eu tremia ouvindo minha mixagem naquela bosta - mas deu tudo certo. 




Reserva


Tita - que ainda estava trabalhando conosco - cismou que Reserva era um hit. Dizia que o solo do André era espacial. Eu concordo. Então resolvemos fazer o clipe dessa, mas com a mesma proposta de Guarde a Última Dança - pegar cenas famosas e mesclar com algumas nossas e nossos cachorros. Quem aparece comigo é a minha vira-lata Maria Bethânia.  A história dos cachorros, etc, já cansei de falar. Como se trata de um post para fãs da Oito Mãos, quem lê sabe qualé. Tita disse que o vídeo iria ficar viral. Mas acho que ninguém entendeu nada de nada. Nem eu. Confesso que não gosto do clipe, mas tem seu charme. Tita fez tudo sozinho. Brigado Titanic! 



Linhas de Fogo


Acho que já contei a história desse clipe um zilhão de vezes. Mas basta dizer que foi mais um que estávamos presentes. Foi gravado no Horto Florestal em São Paulo e foi uma zoeira eterna. Só me lembro de rir o tempo todo. Tinha uma equipe de cinco pessoas, nunca havia visto tanta gente envolvida numa parada da banda! Gabriela Albuquerque é uma atriz de verdade e eu fiquei abismado uma hora que o diretor disse "Gabi, agora você faz cara de curiosa" e ela fez! Na época me parece que as Manifestações de 2013 atrasaram o clipe (não me pergunte como nem porque) mas acabou valendo a espera. Linhas de Fogo é divertido pra caralho. PS: a ideia inicial do André era gravar uma bailarina mandando ver na performance e a trajetória de seus passos seria guiada por linhas de fogo - ia ser impossível financeiramente. 



Ex-Namorados


Mais um clipe que "encomendamos". André entrou em contado com essa incrível artista, explicou algumas coisas e ela comprou a ideia. O resultado é de tirar o fôlego, porque casa tão bem com a canção que é difícil de acreditar que alguém não ligado à banda teve tamanha precisão em seu trabalho. Carol Pedalino foi ímpar e sua atuação e isso só enriqueceu o poder de Aliás. Tempos depois, Tulipa Ruiz lança um clipe em que uma moça segura um buquê de alface... Ex Namorados é o nosso recorde de exibição: 21.819. Não quer dizer nada, é só um número. 






Infância


Feito por Salomé Selomué, essa gringa pirou na coisa. E nos fez pirar. O clipe é tão intenso que o torna um pouco difícil de ver. A música é aquele batuque tribal infinito e esse visual faz do vídeo uma experiência peculiar. Acho que ela pintou mesmo e fotografou cada take e fez tudo isso na moda antiga. Uma artista que vale muita grana, mas como nós está no corre para divulgar o trampo. Claro que pagamos para ela, mas não o que ela merece.  Terceirizar a parada dava menos trabalho, mas o próximo clipe nos deu mais trabalho... 





Pacificamente




Deu um trampo do caralho. Acordamos 6am, descemos para Ubatuba e foi um corre daqueles. Para você ter uma ideia, começamos a filmar era umas 16h da tarde. Os caras da Firehouse Media estavam lá desde cedo e começaram a fazer imagens. Paramos a filmagem na praia logo que começou a anoitecer e estávamos varando de fome - ninguém almoçou, só amendoins e essas coisas. Rangamos uma pizza, tomamos uma cerveja e relaxamos. Já na casa da praia, o diretor disse "Galera, vocês se importam de fazermos mais alguns takes?". Claro que não... Estávamos cansados, mas... Foi um dos melhores dias da minha vida. Quem não gosta de praia e água salgada tem sérios problemas com a própria existência. Roubei um terno do meu pai e acho que até hoje ele não sacou que foi para cair no mar. Depois, na casa da praia, cerveja, cigarro de palha, cigarro de tâmaras egípcias, vida sendo compreendida, algo espetacular... Foi daqueles dias que eu quis pausar para a eternidade. Uma energia soberana, mesmo sabendo que coisas incrivelmente escrotas aconteciam ao mesmo tempo. A relação da banda estava indo pro brejo, mas gravar Pacificamente foi um último esforço (não menor que o nosso último show) e valeu muito, mas muito mesmo, ter feito parte dessa banda. 





Algo Espetacular



Algo Espetacular foi criado com o meu "foda-se, façam o que quiserem". Eu estava fora, puto da cara, e não queria saber de mais nada. Como em Pucc, eles disseram "tudo bem, vamos fazer sem você", e fizeram. Mas eu estava tão puto que não consegui (e ainda não consigo) admirar o clipe. Eu só conseguia pensar "filhos da puta". Não comentei nada e não compartilhei. Engoli em seco essa obra prima da Firehouse e desse senhor que não faço a menor ideia de quem seja. O clipe é de uma pureza surreal, que fechou nossa trajetória com maestria e tudo o que eu conseguia sentir (ainda sinto) é a pena de uma coisa tão bonita ser tão pouco apreciada, a começar por mim. Oito Mãos é uma banda que você ainda vai ouvir falar muito por aqui e nas mesas de bares (o que estou dizendo, nunca mais frequentei bar) ou seja, por aí... A gente ainda vai se esbarrar muito, eu, os caras e você, nosso fã!


Ah, tem o de Infância 2, mas aquilo eu prefiro nem comentar. 

terça-feira, 28 de abril de 2015

Nunca mais eu volto!

Eu nunca mais volto nesse lugar! Quantas vezes você já disse isso e cumpriu com o que disse? Quando eu falo, pode ter certeza - nunca mais piso no local. Hoje pela manhã estava vindo para o trabalho e vi um cara na rua que me lembrou disso. Então esse é um post idiota sobre estabelecimentos que nunca mais voltei, sem a pretensão de queimar o filme desses, mesmo porque são lugares de sucesso e que não dependem da minha presença para continuar com seu sucesso. Antes de tudo, sucesso à todos!

Eu costumava frequentar o Bar Azul. Ia muito com o pessoal da Oito Mãos. Todos os nossos encontros eram lá. Talvez foi lá que passei a tomar Brahma. Certa vez estava com um dos caras e no meio da bebedeira pedimos uma porção de amendoim japonês. Na conta, a surpresa: um potinho por algo em torno de R$28,00. Já saiu para comer nesses botecos no bairro do Cambuí? Pra quem é de fora e lê essa coisa aqui, o Cambuí é o bairro mais nariz empinado de Campinas. Eu sei porque trabalho aqui... Não, não somos nariz empinado. E é aí que ganhamos muitos clientes e ouvimos merdas de outros por não nos curvarmos ao dinheiro - entenda como quiser. Mas isso é outra história. Paguei a conta e disse "nunca mais eu volto aqui". O bar ainda está lá, azul escuro de tão sujo. Mas com sua clientela fiel que não liga por pagar tão caro para comer amendoim. 

Também no Cambuí, na esquina da General Osório com a Júlia de Mesquita, está o famoso City Bar, com o prepotente slogan "O melhor bolinho de bacalhau do mundo". Nem sei, só sei que a torta de frango (quando eu comia frango) dá de dez a zero no tal bolinho de bacalhau. Há também o pastel de belém... Nunca comi, mas deve ser bom. Frequentado por pseudos intelectuais e professores e alunos de jornalismo - e mais uma galera que se diz letrado em qualquer assunto de mesa de bar, assuntos interessantes no geral - o City é de longe o bar mais famoso da cidade. Seu balcão é tão disputado quanto o banheiro (só tem um para cada sexo) e sempre (SEMPRE) a fila para mijar é uma tortura. Mas não é por conta do banheiro que não volto mais lá. O atendimento dos garçons é algo que não dá para entender. Ninguém diz boa noite, ninguém diz obrigado, ninguém sorri. Dá-se a impressão de que uma empresa desse porte não precisa mais agradar a ninguém a não ser a eles mesmos. A parada vende tanto que é problema teu se você quer ou não sentar lá para consumir. É tipo assim: você chega, senta com a galera e chega um garçom dizendo "Brahma ou Skol?" E se eu quiser bater um papo? Nunca mais eu volto lá. Mas é claro, sempre lotado. Tem gente que não liga pra isso. 

Fui levar meu banco do carro para arrumar no seu Nelson, num lugar chamado Estocar. Fica ali, atrás da Barão de Itapura, ao lado da Unimed, escondido do vai e vem dos carros, mas tão famoso que é o primeiro a aparecer no Google quando digitamos "estofamento automotivo" Campinas. Pra começar me deram um chá de espera de quinze minutos porque a única pessoa que poderia me passar orçamento de estofado estava saindo da hora de almoço. A pessoa? O seu Nelson, é claro. Um cara trabalhador, me diz que abre a loja as sete da manhã e fecha as seis. De sábado vai até as duas da tarde. Puta rotina filha da puta. Ou seja, são fodas. Mas não bati com ele. Depois do chá de espera, lá vem seu Nelson empalitando os dentes passando reto por mim. Alguém disse a ele que eu estava esperando. Ele veio com um breve "opa, tudo bom?" e já olhando o que havia de errado no meu banco. Enquanto isso, olhava o carro todinho dizendo "isso aqui também pode trocar, aquilo ali também" e eu dizendo que maneiro saber mas tudo o que eu precisava era arrumar o banco porque não estava aguentando o estado dele quebrado. Passou o orçamento a R$200. Eu disse "e pagando em dinheiro, à vista?" Ele disse "ééé rapaz, fica em R$200 mesmo porque esse é o preço do serviço, vai fazer?" Olhei pra ele e pensei no meu bem estar. Aceitei. O cara fez uma ordem de serviço e escreveu no orçamento: preço, R$220. Desconto de R$20 à vista. Total R$200. Olhei, sorri e disse "Mas o senhor me cobrou duzentos antes de eu pedir o desconto, que raio de desconto é esse?". Ele respondeu "O serviço completo é R$220 garoto, o desconto é esse". Fingi que não ouvi e dei ok. Ele me emprestou um banco dele e ficou com o meu.  No dia seguinte volto lá e um funcionário efetua a troca do banco pronto. Pago os R$200 e vou embora. Mas o banco ficou ruim. Esqueceram de ativar uma trava e o banco saía do lugar. Voltei no dia seguinte e o funcionário, ao invés de dizer "putz cara, viajei, foi mal", disse que não ativou a trava por que tem gente que gosta de usar o banco no máximo pra trás. Eu respondi que do jeito que sempre foi seria ótimo. Ele arrumou a trava. Depois cismei que o banco ficou torto, o funcionário concordou comigo e tentou arrumar o banco colocando o pé nas costas do mesmo - com o detalhe de usar um pedaço de carpete para não sujar. Daí ele pediu ajuda do seu Nelson e veio a gota d'água. O cara jogou o pedaço de carpete pra longe e meteu o sapatão sujo no banco. Depois de não ter sucesso, me disse que banco de Uno é frágil, é pra pessoas com no máximo sessenta quilos e pra eu tomar cuidado ao entrar e sair do carro. Puta que pariu. Minha última resposta foi, ao funcionário, "cara, brigado... eu não vou discutir com ele". Nunca mais eu volto lá. 

Também já aconteceu de eu ouvir isso, mas foi um alívio. Tem uma empresa - claro que não vou dar o nome, afinal são meus clientes - que compra comigo no informal. Vão fazendo uma continha e no dia dez pagam tudo. Uma funcionária de lá quis fazer o mesmo e tomei calote, pois ela saiu fora e ninguém respondeu por ela. Fiquei esperto. Daí uma outra comprava um (sim, UM) galão de limpa pedras e pedia para pagar no dia dez. Certa vez ela não mandou o pagamento. Eu mandei a cobrança. Ela ficou puta da cara, acho que entendeu tudo errado, e me ligou gritando dizendo "você acha que eu sou aquela moça que te deu o calote? Pois fique sabendo que não sou, eu NUNCA MAIS COMPRO COM VOCÊ". O gozado é que ela tem que engolir eu entrar na empresa para entregar pelo menos umas 4 vezes por mês... Quem perdeu foi ela. Mas nunca mais comprou... 

E quando eu trabalho com música também acontece coisas desse tipo. O Andarilho é um bar incrível - pra quem gosta, é claro. Eu, como cliente, jamais piso lá. Não é o meu tipo de lugar, mas respeito quem vai. E como músico fui praticamente proibido de ser chamado para trampar. Explico. As duas vezes que apareci fui recepcionado num clima meio que de cobrança, como se fossem meus patrões. Isso acontece, é normal. Mas a gente mostra profissionalismo e tenta fazer o melhor possível. Eu devia estar atrasado, não lembro. Mas o Amaral é um cara massa a gostou do que viu. Tocamos eu, meu irmão e o Gaúcho. Esse trio era maneiro, uma bagunça daquelas. Nós éramos em dois malucos que não levam desaforo pra casa (eu e meu irmão) e um que tentava conciliar as coisas em prol do trabalho (o Gaúcho, talvez o mais profissional nessas situações). Mas eu já tenho onde engolir sapos. Na música eu não engulo. Daí o dono do lugar tem costume de subir no palco para falar suas coisas. Eu já acho isso uma falta de noção tamanha, mas tem tanto músico que toca lá e aceita essa parada que quem sou eu para dizer não? E a noite foi-se. Até que chegou um momento engraçado. Estávamos tocando Light My Fire do The Doors e na hora do solo eu enlouqueço. Tipo, é o meu momento manja? E estávamos com o público nas mãos. Enquanto eu solava, uma mina foi subindo no palco - bêbada de dar dó - para cantar a canção, sem ser convidada. Eu meti meu corpo enorme como muro e disse "não". Ela falou "mas o Ley deixou". Eu respondi "ele pode ser o dono do bar, mas no palco quem manda sou eu". Eu não sei se foi algo do tipo "aquele cara nunca mais toca aqui". Mas eu sei que eu não piso mais lá nem se o Paul McCartney tocar. Quer dizer, o Paul me leva lá sim.. 

Nossa... Tem tanto assunto com essa coisa de música. Tem gente que não dá. Eu me faço de idiota, mas para alguns caras que agitam noites eu nunca mais trabalho. Gosto da simplicidade da Cachaçaria Água Doce de Barão e da camaradagem dos irmãos do Ponto 1. Certeza que eles já ouviram essa coisa de nunca mais também, todo mundo ouve... É normal. Mas tem uns caras que vou te contar viu... Nunca mais. 





quarta-feira, 11 de março de 2015

Monique Caetano - Alguma Coisa Vai Acontecer

Conheci Monique sobre circunstâncias peculiares da vida. Ela era (é) amiga de uma amiga de minha mulher. Certo dia elas se esbarraram e eu fiquei sabendo da existência desse curioso ser. Eu a imaginava uma moça grossa (não no sentido de má educada, mas no sentido de falar grosso e coçar o saco), branquela e de cabelos curtos. Algum tempo depois cruzei com ela num bazar da minha mulher. Nesse dia eu toquei com meu amigo Felipe da Oito Mãos. Monique era grande fã da banda e fui apresentado a ela com os seguintes dizeres: "Fê, essa é a Monique da qual te falei que foi lá em casa". Monique é linda, morena de cabelos cheios. Um olhar penetrante que demostrava, naquele momento, curiosidade por qualquer merda que saísse de minha boca. Voz bem menos fina do que eu imaginava, mas ainda sim cheia de personalidade. Falamos sobre música, é claro. Não me lembro se ela chegou a falar de si sobre ser cantora. Só sei que ela estava lá não apenas pelo bazar, mas para ouvir o som que iriamos fazer. Tocamos e depois a Jéssica - amiga da minha mulher - teve a brilhante ideia de pedir para Monique dar uma canja. Ela ficou extremamente sem graça, mas de tanto insistirem ela foi. Pegou meu violão e tocou. Havia uma timidez ali, mas também havia uma necessidade de vencer o medo do ridículo. Eu pensei "opa, que coisa..." E comentei com alguém "Essa moça daria um belo disco". Até cheguei a mencionar algo que eu não lembro, mas que ela jura que eu disse: "Você precisa de alguém para te gravar, mas esse alguém não pode ser eu no momento". 

Aí o momento passou... E, que coisa, chegou o momento. Pedi para ouvir suas músicas e ela me mandou as gravações básicas que estavam no You Tube com os dizeres "Fê, não repara na má qualidade". Tudo era muito visceral e muito cru. Basicamente eram folhas de cadernos rabiscadas com as letras das canções e alguns acordes. Se essas canções dizem algo - algo forte, direto e assustadoramente sincero e biográfico - mas estão cruas, isso é um prato cheio para um produtor musical como eu. A chance de agarrar obras de arte e molda-las seguinte o caminho que você quiser. 

Algumas eram bem diretas no sentido de arranjo e estrutura, como é o caso de Só Eu e Você, faixa que abre o disco com uma virada de batera e Monique Canta sem parar para tomar água - é uma enxurrada de informação sonora - mas simples, é claro. "Todo mundo diz que somos tão jovens pra saber do amor, mas essa gente tão sábia anda tão infeliz".  Por falar em batera, escalei um grande músico - meu irmão Ítalo. Foi fácil gravar 8 das 10 canções (duas eu toquei a bateria porque eu simplesmente queria). 

Outras eram quase diretas - o caso do samba A Graça Dela, que tocamos na porta do rock, abrimos a porta e sorrimos dizendo um sussurrante "oi". Ou a sacana Ímpar. Porque sacana? Uma música dessa é sacanagem... Porra. Linda demais. 

Preciso mencionar Calmaria - um rock que me deu espaço para fazer um final longo e cheio de camadas. Nessa canção tivemos memoráveis sessões de gravação do que chamamos de festa. A ideia foi abrir uma cerveja e se embriagar na frente do microfone, tudo isso de madrugada. 

Por fim, Lavar o Sol é a minha preferida porque ali eu realmente peguei uma tela branca e pintei do jeito que mais me deu na cabeça. "Eu vou levar o Sol mesmo a quem só me trouxe a tempestade". Mais cristão que isso, impossível. 

São 10 canções que eu tive a honra e o prazer de tirar da gaveta da artista e transformar em canções de disco. Ela virgem de estúdio e eu ainda procurando a tacada certeira. A cada disco que eu faço tenho a certeza absoluta de que acertei. Dessa vez não foi diferente. A gente sabe que alguma coisa vai acontecer. Todo dia algo acontece. Monique foi uma grande coisa que aconteceu. 

Viva a música. 


quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

Sobre Palhetas



Essa semana fui na loja de instrumentos comprar uma coisa tão pequena mas tão útil que quando falta no meu porta níquel da carteira é desespero na certa: palhetas. Uso Dunlop 1,14mm para o baixo e 88mm para violão e guitarra. Comprei cinco unidades, para durar "pra sempre", é o que me diz minha ingênua consciência. No vai e vêm das coisas, palhetas se perdem como fios de cabelos nos travesseiros. Ou isqueiros (o hábito de acender um cigarro e colocar o isqueiro no bolso faz de você não um ladrão, mas um escravo do costume - e você acaba roubando sem querer o isqueiro de quem te emprestou. Quando tem festa lá em casa no dia seguinte a gente acha uns sete de todas as cores) de qualquer modo, estamos falando sobre palhetas - ou sobre coisas pequenas úteis que se perdem. Deixei dez mangos e fiquei pensando na época em que uma palheta custava cinquenta centavos.

Quando moleque fiz um colar e pendurei uma palheta da marca Fender na ponta, para deixar claro a todo mundo que eu era guitarrista (coisa de moleque bobo) - quem nunca? Um amigo meu na escola, Leopoldo Pardi, também usava um colar desses e eu perguntei que guitarra ele tinha. Ele me disse que tocava baixo. Eu, influenciado por algumas das babaquices que os pais dizem, ri da cara dele dizendo que baixo não se tocava com palheta. Meu pai dizia isso para mim e menosprezava músicos como Duff Mckagan, do Guns And Roses (minha banda preferida da época). Mais tarde, quando a gente começa a perceber que nossos pais não sabem tudo, fui sacar que alguns músicos tocavam seus baixos de palheta. Assim que vi Paul McCartney, truquei meu velho: "Mas o cara ae dos Beatles toca de palheta"... Ele não teve resposta e comecei a duvidar da verdade paterna. Para arrematar a coisa vi Sérgio Dias arrebentando no walking bass de palheta na mão direita. Já era, eu também tocaria meu contra baixo de palheta. Meu irmão me viu gravando uma trilha e me disse "cara, você toca igual o Paul né?". Respondi com um olhar desafiador somado da mais pura sinceridade: "é claro, ele é o maior do mundo". 




Na Oito Mãos meu nobre colega Leandro Publio me apelidou por um breve momento de "gnomo das palhetas". Toda vez que eu precisava mostrar alguma coisa na guitarra eu pedia a palheta dele. É claro que eu colocava no bolso assim que acabava a exibição, mas não fazia de propósito. Era a força do hábito. Aliás a coisa que mais se ouve quando há um show para acontecer é "ow, tem uma palheta aí?". Até os caras do Charme Chulo fizeram essa clássica pergunta ao Publio num dia que dividimos um palco.  Eu e meu caro Rafael Castro, da JB E Seus Amigos Sex Symbols, estávamos prestes a subir num palco quando ele me pediu para ficar com meu afinador eletrônico de braço. Eu disse "porra, você não tem um afinador?" Ele sacudiu a cabeça, meio sem graça. Em seguida fui vingado. "Ow, tem uma palheta sobrando ae?" Ficamos quites. 



Ainda falando sobre Oito Mãos e contra baixo, Felipe Bier é o contrário. Usa os dedos. Eu falava que isso era coisa de franguinho. "Usa uma palheta ae mano!", sempre indeferindo minha proposta. Apenas em Rosa, de Aliás, ele usou a palheta, e na gravação. Ao vivo ia no dedo mesmo. 

Certa vez estávamos num show dos Titãs, há anos, na festa do figo em Valinhos-SP. No fim do show Tony Bellotto jogou sua palheta num aglomerado de moleques. Meu amigo João Paulo saiu correndo, como um hobbit, ajoelhou e entrou por debaixo da galera. Eu não sei como - até hoje me pergunto - mas ele voltou todo eufórico com a palheta do cara nas mãos. Outra vez, com esse mesmo amigo, estávamos na primeira fila dum show dos Paralamas na Red Eventos. Era a apresentação do acústico e lá estávamos, batucando no chão do palco todos os arranjos do disco. No fim o Hebert me escolheu para dar a palheta amarela dele com o seu nome. Fiz um porta retrato desse objeto junto do ingresso do show e lá ficou por anos. Um dia eu tive que usar essa palheta (que estava na minha carteira, e era a única) destruí ela na hora. Ainda a tenho, partida, em algum lugar da minha vida. Outro cara que consegui a palheta foi Juninho Afram, mas foi uma decepção - o cara usa aquela Jazz 3, minúscula, ridícula. 




E teve uma vez também que eu estava no salão do Anhembi, na feira dos músicos (aff) eu e meu amigo Lucas Bocchese queríamos testar uns instrumentos, mas estávamos sem as benditas palhetas. Dando aquele rolê percebemos que tinha um tal João Alguma Coisa autografando cartões da marca da guitarra que ele representava e doando uma palheta para cada fã. Não pensamos duas vezes e lá fomos para  fila. Peguei a palheta e ainda emendei um "valeu,cara... sou te fã". Porra, que sacanagem. 

Por fim... Essa semana eu fui comprar pelhetas para durarem para sempre, como citei acima. E ao abrir a caixa onde ficam as pequeninas expostas, me lembrei da primeira vez que peguei uma palheta nas mãos. Meu pai tinha um amigo que chamávamos de Tio Paraná. Ele esqueceu uma palheta lá em casa, eu deveria ter uns oito anos. Era um objeto bem colorido, verde, azul, prata. Peguei na palma das mãos e fiquei viajando, sobre como legal seria usar aquele objeto... Mas primeiro eu precisaria aprender a tocar... 

Não é que eu aprendi?